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A constituição:

Em regimes republicanos é necessária uma lei constitucional para definir direitos e deveres e regular as instituições, para definir quais são, como são eleitas, os seus âmbitos de governação. Deve ser suficientemente sucinta e compreensível para que todos possam compreender o seu conteúdo, desde o cidadão comum até ao presidente da república que é por definição o principal garante do seu cumprimento.

Assistimos agora em Portugal a uma situação em que se torna óbvio que a constituição portuguesa não é uma constituição, mas sim uma amálgama de artigos, uns constitucionais, outros de motivação ideológica, outros que nem se sabe o que são. Em vez de ser compreensível ao cidadão comum, são necessários 12 juízes constitucionais para compreender o que lá diz e nem esses estão de acordo.

A decisão de tornar inconstitucionais os cortes dos subsídios dos funcionários públicos, independentemente de se concordar ou não de um ponto de vista político, é ridícula de um ponto de vista democrático. É uma decisão orçamental tomada por maioria na assembleia da república, e o orçamento de estado é a principal decisão política de cada ano e a mais importante do governo e da assembleia. Estamos num país de burocracias e interesses instalados em que já é muito difícil mudar o que quer que seja e o caminho é de que seja impossível.

A constituição original de 1976 é uma vergonha para qualquer democracia, dado que entre outras coisas indicava logo nas primeiras linhas o rumo ao socialismo (em democracia não se poderá votar noutro rumo?). Apesar de já ter sido muito reescrita nas inúmeras revisões constitucionais, só existe uma solução verdadeiramente eficaz: rasgar e escrever de novo, de preferência com 1/10 do tamanho e à imagem das constituições das sociedades modernas bem sucedidas.

A esquerda, a esquerducha e os interesses instalados:

Os valores de esquerda são pilares importantes das sociedades modernas, focam desde liberdades individuais à igualdade perante a justiça. Para evitar confundir as coisas vou designar por esquerducha os partidos que em Portugal se dizem “de esquerda” assim como as uniões sindicais que lhes estão associadas.

Ao contrário do que se faz crer, a esquerducha portuguesa não protege os pobres e os desfavorecidos, não promove a igualdade de oportunidades, não promove a criação de riqueza (inequivocamente a melhor forma de combater a pobreza).

Os problemas do país são muitos, estando de certeza a esquecer-me de vários lembro-me por exemplo do desemprego, especificamente o desemprego jovem e de longa duração, o trabalho precário, a falta de produtividade, a ausência de criação de riqueza, ausência de investimento interno e externo, etc.

O que não está sequer na lista dos problemas são os direitos e salários dos funcionários públicos, aliás está na lista dos problemas mas é por serem privilégios excessivos, ordenados em média muito acima da produtividade, emprego certo, reforma certa, falta de qualidade, ausência de oportunidade para quem está fora do sistema, etc.

A esquerducha defende os interesses instalados e as classes privilegiadas, nomeadamente os funcionários públicos e trabalhadores de empresas públicas, aqueles em que se gasta milhares de milhões e criam zero de riqueza para o país. Um bom exemplo são as greves promovidas pela esquerducha, porque em Portugal, hoje, só podem fazer greve aqueles que têm emprego certo e reforma certa, os privilegiados.

Os empreendedores, que têm que se bater dia e noite por produzir, criar riqueza, e conseguir milagrosamente acabar o mês ou o ano no verde depois de pagar a carga insuportável de impostos, esses não têm direitos, não fazem greves e não têm subsídios.

Não estou com isto a culpar os funcionários públicos em si, mas sim políticas seguidas durante as últimas décadas em que a maior medida de combate ao desemprego foi contratar mais funcionários públicos do que era preciso, abdicando de selecção, formação e eficiência.

A função pública como está, está mal, apesar de ainda usufruir de direitos excessivos faltam as motivações. Classicamente há duas motivações (a cenoura e a cana), neste caso concreto, ou há progressões na carreira baseadas no mérito (cenoura) ou despedimentos (cana), não haver nem uma nem outra é a solução de compromisso que é a pior possível e a que não agrada a ninguém. Eu sou a favor dos despedimentos para que se possa voltar a premiar o mérito, pagar subsídios e abrir oportunidades a quem está fora e possa ser uma mais-valia.

A esquerducha, que vê apenas 1 cm à frente do nariz, diz que os despedimentos criam desemprego  e a liberalização dos direitos do trabalho criam trabalho precário, pois é exactamente o contrário. Se não há emprego para todos e pensando no interesse geral, que haja mais oportunidades para quem tem mais mérito e para quem está de fora do sistema nomeadamente os jovens qualificados. Que se possa despedir 1 funcionário ineficiente que ganha muito para contratar 2 ou 3 mais qualificados a ganhar menos e assim aumentar a produtividade geral. O excesso de direitos de uns é o principal responsável pela criação de uma classe de trabalhadores sem direitos, precários. Que sejam normalizados os direitos dos trabalhadores, para que possa haver trabalhadores, para que as empresas possam contratar sem terem que se comprometer a carregar um fardo para a vida.

Apesar de eu defender maioritariamente valores de direita como privilegiar a criação de riqueza e o dinamismo da economia, relativamente ao comodismo; por vezes quando sistematizo as minhas ideias acabo por perceber que não consigo de deixar de pensar à esquerda no sentido das liberdades individuais e igualdade de oportunidades, simplesmente penso mais em quem está fora do sistema do que em quem está dentro, naqueles que de facto estão mal e não nos que fazem de conta.



Edit:
Por questões de acessibilidade transcrevo aqui o artigo da constituição que serviu de base à inconstituicionalidade dos cortes dos subsídios aos funcionários públicos.


Artigo 13.º
Princípio da igualdade
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.

3 comentários:

  1. petersimon69 disse...

    Parabéns pelo excelente post João!
    Concordo em grande parte contigo!
    Não sendo Função Pública (embora os vários Governos façam questão de fazer a equivlência para retirarem alguns direitos e colocarem mais deveres) fui militar 21 anos e estou plenamente de acordo que o sistema da "cana" é melhor e talvez a única solução para "limpar" centenas ou milhares de ineficientes, subprodutivos e demasiado bem pagos funcionários públicos e o mesmo se passa na Instituição Militar. Claro que estamos a falar de apenas uma parcela de Funcionários Públicos... pois a maioria, que conheço, são excelentes profissionais e contribuem significativamente para o prestigio e bem estar do País.
    Não poderia estar mais de acordo contigo quando falas no último paragrafo na dificuldade de escolha entre existir um sistema político que crie riqueza e um que promova igualdade e liberdade. Infelizmente nós temos o pior sistema... nem é carne nem é peixe, isto é, não promove/incentiva a criação de riqueza e a cada dia de governação
    vemos que existem "uns mais iguais que outros".
    Abraço!

  2. SrReNo disse...

    FOLD

  3. Nuno Geraldes disse...

    Caro João,
    Confesso que não conhecia o seu blog, mas desde já lhe dou os meus parabéns pelos temas aqui abordados.

    Contudo, creio que se equivocou nesta frase:
    "Os valores de esquerda são pilares importantes das sociedades modernas, focam desde liberdades individuais à igualdade perante a justiça."
    A esquerda não defende a liberdade individual - a esquerda representa o maior ataque à liberdade individual.
    Sem propriedade, não há liberdade individual. Com planeamento centralizado não há liberdade individual.
    A liberdade individual só é defendida por uma corrente de pensamento, precisamente o liberalismo.
    Não sei se conhece a escola Austríaca (von Mises, Hayek, Rothbard), mas aqui fica a referência. Esta escola de pensamento dedica-se a defender a liberdade individual e, ainda antes do socialismo ser posto em prática, conseguiu prever todas as consequências nefastas dessa ideologia (sob as suas diferentes formas). Além disso, quase todos os economistas que conseguiram prever todas as últimas crises económicas do último século eram "austríacos". Peter Schiff, Jim Rogers, Marc Faber, Ron Paul e muitos outros previram a bolha das dotcom, a bolha do sub-prime, a bolha da dívida pública - esta a última e definitiva bolha, que ainda não estoirou completamente.
    Caso queira perceber como a escola austríaca explica as crises económicas, procure no youtube por Tom Woods austrian business cycle. Veja como assenta que nem uma luva naquilo que estamos a viver.

    Abraço



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